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Instituto Lula promove seminário sobre relações da China com o Brasil e o mundo

O primeiro encontro aconteceu nesta terça (23), em São Paulo. O próximo evento acontecerá em junho, no Rio de Janeiro


Instituto Lula promove seminário sobre relações da China com o Brasil e o mundo

Instituto Lula 

Um dos principais mercados mundiais, a cada ano a China aumenta seu protagonismo na economia internacional. Essa pauta de extrema relevância foi tema do seminário “A China no Mundo e o Brasil”, promovido pelo Instituto Lula na tarde de 23 de abril, em São Paulo.

O evento faz parte do ciclo de debates Brasil-China: Parcerias para o Futuro, que o Instituto Lula realiza em 2024, marcando os 50 anos das relações diplomáticas entre os dois países.


“Queremos fomentar um diálogo profundo sobre as multifacetadas relações entre Brasil e China, estabelecendo uma plataforma essencial para o aprofundamento do conhecimento sobre as dinâmicas econômicas, políticas e sociais que moldam essa parceria estratégica”, afirmou a presidenta do Instituto Lula, Ivone Silva, durante a abertura do seminário. “É muito importante que nós, nesse momento de reconstrução do Brasil, pensemos quem são e quem serão nossos parceiros comerciais.”


Dirigentes sindicais e de movimentos sociais foram convidados para participar dos debates realizados após a série de exposições do seminário.



Ivone Silva, presidenta do Instituto Lula. Foto: Elineudo Meira (Chokito) 


Ascensão chinesa

Para dar uma ideia da potência desse crescimento chinês, em 20 anos, entre 2001 e 2021, o país oriental saltou do terceiro para o primeiro lugar na participação da produção industrial mundial. Saiu de 10% para 28,3%, deixando para trás os mercados europeu e norte-americano. A União Europeia viu sua participação cair do primeiro lugar, com 20% em 2001, para o terceiro lugar, com 14,5% em 2021. Os Estados Unidos mantiveram-se na segunda posição, caindo de 20% para 16% no período. 


Os dados abriram a apresentação do professor Giorgio Romano Schutte, da Universidade Federal do ABC (UFABC). Em sua exposição sobre a ascensão chinesa, a Era Xi Jinping e os 50 anos das relações diplomáticas entre Brasil e China, o professor demonstrou que o crescimento chinês é sólido. Desde 1978 até 2023 chega a uma média de 8,9%, muito maior que a dos países da OCDE e dos Estados Unidos.


Assim, avalia ele, as teorias que apontam para um possível colapso chinês não se sustentam. “É um país que nunca sofreu uma crise financeira e que mantém mais de 90% do seu sistema bancário estatal.”


Rota da Seda

De olho nessas relações tão intrincadas, o governo chinês de Xi Jinping lançou em 2013 o BRI (Belt and Road Iniciative), a Nova Rota da Seda. O conjunto de programas de investimentos foi inicialmente focado em países da Eurásia. Daí seu nome, já que visava construir um cinturão econômico ao longo da Rota da Seda, visando inclusive maior entendimento entre os povos.


“Na visão chinesa, essa política externa mais ativa ajudaria a resolver problemas de desenvolvimento nos países participantes, ao mesmo tempo em que criaria um mundo mais aberto, inclusivo, harmônico, com diferenças legitimadas”, explicou a professora Ana Tereza Marra, coordenadora da pós-graduação em Relações Internacionais da UFABC. No seminário, ela falou sobre BRI no mundo e na América Latina, já que o programa do cinturão econômico chinês se estende, desde 2017, a mais de duas dezenas de países da região do Sul Global. 


O Brasil estuda se fará parte do BRI diante de questões como os reflexos dessa adesão nas relações econômicas com os Estados Unidos e que melhorias poderiam trazer ao desenvolvimento nacional. 


Investimentos chineses 

Professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), especialista nas relações Brasil-China, Celio Hiratuka apresentou um balanço sobre esses vínculos, além das perspectivas diante dos desafios apresentados à reindustrialização brasileira.

 

A ascensão da China e seus impactos crescentes na economia global são parte importante do cenário de desindustrialização do Brasil, que se agrava no século 21. “Um longo processo de perda de dinamismo industrial e econômico, diante da dificuldade de manter investimentos na indústria e em infraestrutura, fundamentais para levar à frente o processo estrutural de mudanças e a elevação da produtividade média”, elencou o professor. “Um processo ainda mais grave se consideramos as rápidas transformações globais com a difusão da revolução 4.0 nos anos mais recentes”, avalia.


Assim, cenários de reindustrialização devem levar em conta a necessidade de uma estratégia clara do Brasil no que se refere às suas relações com a China. “Com um balanço detalhado por setor e segmentos sobre oportunidades, riscos, instrumentos e atores chaves”, concluiu. 


Abordagem jurídica

A professora Michelle Sanchez-Badin, da Faculdade Getúlio Vargas (FGV), apresentou o contexto e as particularidades dos investimentos chineses no Brasil, notadamente no setor elétrico e agrícola, e as abordagens jurídicas em torno deles. Também reforçou um aspecto fundamental dessa relação: o crescimento nove vezes maior da economia chinesa em relação à brasileira desde a década de 1990.


Algumas tendências foram apontadas diante desse quadro. Por exemplo, os investimentos chineses em energias renováveis (matriz energética limpa) que poderiam ser atrelados à reindustrialização brasileira. Também os arcabouços regulatórios adequados para reduzir as assimetrias de comércio e investimento. 


O interesse em produzir veículos elétricos no Brasil e o investimento para produção de insumos para bateria (lítio) também estariam entre essas tendências. Assim como o aumento dos investimentos em tecnologia. “Em 2022, o setor ficou em segundo lugar. Em primeiro ficou o setor de energia”, informou a professora.


Perspectivas políticas

O histórico das relações entre o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Comunista Chinês (PCCh) foi apresentado pela integrante da Executiva Nacional do PT e Secretária Executiva do Foro de São Paulo, Mônica Valente.


Nascido em 1980, o PT teve sua primeira missão na China em 1984. “Este ano comemoramos 40 anos de relações políticas entre o PT e o Partido Comunista da China”, lembrou Mônica. “Em 2004, no primeiro governo do presidente Lula, foi assinado um primeiro protocolo de cooperação entre os dois partidos, renovado em 2023.”


Esse protocolo regula os debates e propõe temas como a troca de opiniões sobre a conjuntura mundial. “Isso é natural entre partidos políticos de países diferentes”, explicou a dirigente.


Partidos com viés de esquerda e anti-neoliberal, outra discussão que está sempre presente entre PT e PCCh é o tema da estratégia de desenvolvimento com combate à desigualdade. Tendo o Estado um papel fundamental nisso.


“E um terceiro item: a discussão sobre uma ordem mundial multilateral, que os chineses chamam de uma ordem mundial sem hegemonismos. Que é como eles se referem agora aos Estados Unidos. E que se traduz numa parceria política estratégica no G20, nos Brics, no banco dos Brics”, afirma Mônica.


No último encontro entre os partidos, em 2024, um segundo protocolo de cooperação passou a agregar, a pedido dos chineses, o interesse em compartilhar opiniões sobre os debates feitos no âmbito do Foro de São Paulo, diante dos investimentos do país oriental na América Latina.


Mônica Valente defende que o Brasil reúne condições políticas e históricas para que, num pacote de negociação entre Brasil e China, sejam inseridos temas das garantias sindicais. “Temos de negociar como nação, não só os interesses industriais, empresariais ou econômicos. Mas também os interesses sociais e sindicais. E, sendo um governo do PT, não tem cabimento deixar passar essa oportunidade histórica.”   



Os diretores do Instituto Lula, Wellington Damasceno e Ana Flávia Marques e a presidenta Ivone Silva posam com sindicalistas. Foto: Elineudo Meira (Chokito)


Movimentos sindicais e sociais

Os possíveis posicionamentos dos movimentos sindicais e sociais diante das iniciativas chinesas foi o tema da exposição do economista Adhemar Mineiro, da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (Rebrip).


Alguns elementos de contexto dessa relação entre Brasil e China têm base nas aproximações diplomáticas feitas ao longo do século 21. A China passa a participar do Grupo dos 20 (G-20) na Organização Mundial do Comércio (OMC), um grupo liderado por Brasil e Índia. “Já aí ela mostra essa pretensão de alinhamento, mesmo sendo mais importador que exportador de commodities agrícolas”, avalia o economista. “E isso se reforça com a crise de 2007/2008, da qual são filhos simultâneos o G-20 e o Brics.”


A partir da segunda década do século 21, essa situação se torna um pouco mais complexa. Não só pelos governos de extrema-direita, como o de Jair Bolsonaro no Brasil. “Um quadro confuso que sugere a gente pensar numa elite brasileira, como a do agronegócio, que tem essa relação tão profunda com a China, mas que tem a cabeça em Miami e o bolso na China. E o governo expressou isso no seu comportamento”, comparou Adhemar, destacando que tudo isso tem consequências sociais e ambientais para o Brasil. No ambiente internacional, há ainda a disputa hegemônica entre Estados Unidos e China. “Isso dá um quadro de relações que acaba batendo aqui dentro.”  


O próximo encontro acontecerá no dia 11 de junho, no Rio de Janeiro e terá como tema as implicações da cooperação Brasil-China para a ciência e tecnologia, com foco no complexo industrial da saúde. 


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