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Ricardo Carneiro: Crescimento e inclusão social no Brasil

Acompanhe o segundo texto da série O Brasil de amanhã


Ricardo Carneiro: Crescimento e inclusão social no Brasil

Rua 25 de março em São Paulo, um dos símbolos do consumo popular no país. Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas

Por Ricardo Carneiro¹
Para Marco Aurélio Garcia (In Memoriam)

Não foram poucos e nem pequenos, os resultados alcançados pelo desenvolvimento com inclusão social durante os governos Lula e Dilma. A economia brasileira voltou a crescer a taxas significativas entre 2004 e 2013, um período relativamente longo, em sucessão ao desempenho medíocre dos últimos vinte anos do século 20. O dado mais eloquente para traduzir esta trajetória é o do PIB per capita: entre 1980 e 2003 ele cresce apenas 6% — uma taxa anual de 0,02% -, contrastando com o aumento de 30% entre 2004 e 2013, um incremento anual de 2,6%. Ademais, as reduções da desigualdade social e da pobreza, associadas à ampliação da mobilidade social, conferem a este período histórico um caráter original.

A melhoria dos indicadores sociais foi significativa. A título de ilustração, cabe destacar a redução do altíssimo coeficiente de Gini, que mede a desigualdade no país e havia permanecido em torno de 0,60 por mais de duas décadas, durante os anos 2000, chegando a valores próximos de 0,50 em 2014. A taxa de pobreza, constante ao redor de 35% em todos os anos 1990, mostra uma trajetória fortemente declinante após 2003, alcançando o percentual de 13% em 2014. Por trás desses percentuais há milhões de pessoas: cerca de 45 milhões, que deixaram a pobreza e ascenderam para os estratos da classe trabalhadora e da baixa classe média realizando o grande desiderato do programa do PT, a ampliação do consumo das massas.

Se fosse imperativo sublinhar o principal aspecto da inclusão social, este seria, sem dúvida, a mobilidade social, involucrada nos ganhos de renda e na transformação dos padrões de consumo.

Houve avanços e também obstáculos difíceis de transpor, destacando-se aqui a não transformação da estrutura produtiva e do emprego e a permanência, a despeito da melhora, de uma elevada concentração da distribuição funcional da renda, sobretudo pela capacidade dos grupos mais ricos da população em resistir à maior tributação de seus rendimentos. Esses óbices, somados a restrições estruturais, terminaram por levar à desaceleração do crescimento e à crise subsequente, embora esta última, dada a sua profundidade e caráter multidimensional, não possa ser creditada exclusivamente a fatores econômicos.

À luz desses fatos históricos e de outros menores reportados adiante, este texto procura analisar os avanços e obstáculos do desenvolvimento brasileiro, com o intuito de indicar possíveis soluções para construção de uma proposta de desenvolvimento para o Brasil de amanhã. Com o objetivo de formular alternativas, estas propostas não se atêm apenas às heranças positivas do período de crescimento com inclusão social, mas consideram a herança deletéria do desmonte realizado pelo Governo Temer, pois é também delas, e das restrições que impõem, que se terá de partir.

O pano de fundo sob o qual se levou a cabo o crescimento com inclusão social foi o de economias desenvolvidas crescentemente financeirizadas e globalizadas. Enfatizar este marco é importante para compreender a natureza e intensidade dos obstáculos ao desenvolvimento de uma economia periférica, como a brasileira. A financeirização e a integração da economia brasileira, via abertura financeira, bem como a globalização produtiva e a integração nas cadeias globais de valor, criaram importantes constrangimentos ao desenvolvimento brasileiro. Comparativamente a outros períodos históricos, como o do regime de Bretton Woods, as restrições se colocam de maneira mais intensa, mas não de forma absoluta. Aliás elas não devem ser consideradas como um condicionante externo isoladamente, mas sobretudo, na sua articulação com estruturas e processos domésticos.

1. Avanços e obstáculos

A sucessão dos governos liderados pelo PT indica a prevalência de dois modelos de crescimento: nos mandatos de Lula, predomina o modelo comandado pelo binômio consumo + investimento induzido. No primeiro mandato Dilma, agrega-se ao binômio anterior, a tentativa de ampliar o investimento autônomo, com maior indução e participação estatal, concentrado nos setores mais intensivos em capital ou tecnologia.

Desses padrões, tanto do seu sucesso quanto dos limites estruturais ou de política econômica, emergem algumas restrições comuns aos dois períodos, embora com matizes diferentes em cada um deles. Esses avanços e obstáculos podem ser identificados como:

  1. a melhoria da distribuição da renda e as restrições ao seu aprofundamento;
  2. a ampliação do crédito e os limites à sua elasticidade;
  3. o papel do Estado via investimento público e financiamento;
  4. o novo padrão de concorrência global e a desindustrialização;
  5. a abertura financeira e seus condicionantes à gestão macroeconômica.

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