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Flávio Jorge recebe homenagem da Fundação Perseu Abramo

Liderança pioneira da luta antirracista e pela democracia no Brasil, Flávio influenciou várias gerações de militantes e será lembrado como um elo entre o movimento negro e a esquerda


Flávio Jorge recebe homenagem da Fundação Perseu Abramo

Foto: Sérgio Silva

Por Fundação Perseu Abramo


Na última quinta-feira (27), o conselheiro do Instituto Lula, Flávio Jorge, morto em 6 de junho passado, recebeu uma homenagem realizada pela Fundação Perseu Abramo. Reuniram-se amigos, ex-companheiros, familiares e admiradores que foram influenciados por ele para relembrar momentos importantes de sua trajetória. Participaram presencialmente o presidente da Fundação Perseu Abramo e diretor do Instituto Lula, Paulo Okomatto; a ex-ministra da Igualdade Racial Matilde Ribeiro; a ex-diretora do Instituto Lula e atual Assessora Especial do Ministro da Justiça e Coordenadora do Pronasci, Tamires Sampaio; Selma Rocha, Gilson Negão, da Conen; Paulo Rafael da Silva, Romildo José dos Santos e Alva Helena de Almeida, da Soweto, além de seu filho Pedro Jorge e outros familiares. 


Imenso legado no CSBH

O evento foi aberto pela diretora da Fundação Perseu Abramo, Elen Coutinho, hoje à frente do Centro Sergio Buarque de Holanda de Documentação e Memória Política (CSBH), que organizou uma página na internet permanente de homenagem a Flávio Jorge, onde constam fotografias, textos, entrevistas e diversas produções do acervo, parte do imenso legado deixado por ele.


O presidente da Fundação Perseu Abramo, Paulo Okamotto, destacou uma preocupação compartilhada entre ele e Flávio Jorge: o desafio de conquistar mais militantes para a causa negra, a área da saúde e a luta social no Brasil. “Nós precisamos ter mais militantes, mais pessoas que lutem, que façam o que ele fez. Ali, sim, havia um brasileiro com consciência, que amava seu povo e que lutou com todas as forças para mudar essas desigualdades e o racismo que ainda persistem em nossa sociedade”, afirmou.


O antropólogo e professor da USP Kabengelê Munanga disse que Flávio esteve presente em todos os processos que levaram à criação da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), no primeiro governo Lula, e também à aprovação da Lei 10.639, que tornou obrigatório o ensino da história afro-brasileira nas escolas.


Flávio conheceu Munanga quando era um jovem líder estudantil e o convidou para participar de debates que organizava na PUC sobre os dilemas da população negra brasileira, onde depois estiveram também os professores Milton Santos e Wilson do Nascimento Barbosa. “Milton era um grande intelectual sobre as questões humanas, mas não era um estudioso da população negra. Wilson havia ficado no exílio durante a ditadura, na Áustria, mas não tinha um posicionamento claro sobre o racismo. Naquele dia, Flávio colocou a gente contra a parede, e, pela primeira vez, vi os dois discutirem publicamente essa questão. Ele provocava muito, criticava nossos argumentos teóricos que nada tinham a ver com o cotidiano da população negra no Brasil, e eu pessoalmente aprendi muito com ele”, afirmou.


Presente na Constituinte

Selma Rocha, que o conhecia desde a época do movimento estudantil, lembrou que se reencontraram no PT para organizar o movimento social e atuar no momento da Constituinte, um dos mais belos que o país viveu. “Nos formamos nessa dialética: o movimento social levantava questões sobre direitos e democratização e, ao mesmo tempo, nós construíamos o PT discutindo coisas estruturais para a sociedade, tais como o racismo, a saúde, a educação, as políticas habitacionais”, lembrou. Posteriormente eles foram contemporâneos na diretoria da Fundação Perseu Abramo e compartilharam uma sala durante anos, consolidando uma grande amizade.


A advogada Tamires Sampaio, que representou o Instituto Lula, emocionou-se muito ao referir-se a Flávio Jorge como “seu pai” no movimento negro. “Ele era como um farol. Às vezes temos momentos na vida em que estamos no escuro, não sabemos o que fazer, eu falava com ele e uma luz acendia. Quando eu soube que ele tinha morrido, tive a impressão de que o farol havia apagado e eu estava no escuro”, disse. Ela destacou seu papel como referência de muitos jovens de várias gerações ao entrarem na luta antirracista. “É preciso virar essa chavinha do luto para a luta. Flávio estava há mais de cinquenta anos construindo ações e revoluções, as conquistas dos últimos quarenta anos tinham seu DNA. Temos, assim, a responsabilidade de melhorar e ampliar essas conquistas e formulações. Esse farol, agora, é um farol de estrela”.


Alva Helena, da Soweto, disse que se surpreendeu quando realizou a organização do acervo com os certificados que comprovam a presença de Flávio em centenas de eventos nacionais e internacionais representando a organização ao longo dos anos. “A gente se deu conta do tamanho da Soweto, por conta da documentação. Tudo o que vocês podem imaginar de eventos, convites, teses políticas, homenagens em Câmaras Municipais, OAB, Brasília, tudo comprovava a participação dele”, disse.


O filho de Flávio Jorge, Pedro, encerrou o ato com um texto emocionante. Sobre o pai, destacou que sempre foi bom aluno, gostava de reggae e apreciava particularmente a música de Bob Marley Get up, stand up, cujo refrão é “Levante, resista: lute pelos seus direitos!”.


“Para quem não me conhece, sempre fui rastafari, e sou até hoje, com muito orgulho. Meus pais me deram esse privilégio de carregar essa coroa da resistência, e acredito que resistir seja um dos sinônimos do meu pai. Para mim, sua semelhança com Bob Marley não é só física, mas a luta pacífica. Ele sempre foi e será uma liderança entre nós, que traz a conciliação, a virtude, o diálogo e o amor. Para nós e as entidades, todos os que o conheciam, fica a responsabilidade de dar seguimento a essa luta. Como pai, foi um amigo, um parceiro, um herói, não somente pra mim, mas para muitos outros”.


Assista à homenagem completa:



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