Pesquisa resultado de parceria entre Instituto Lula e Fundação Friedrich Ebert aponta desafios e soluções para a inclusão digital no Brasil
Reprodução
12/07/2022 15:07
O Instituto Lula, em parceria Fundação Friedrich Ebert Brasil, lançou na manhã desta terça-feira (12) o terceiro e último livro com os resultados da pesquisa Democracia e Representatividade - Novas Formas de Representação Diante da Transformação Digital. Esse material trata do acesso à tecnologia dos públicos LGBTQIA+ e idosos, e de lideranças do movimento dos trabalhadores. Dois livretos e duas revistas digitais já foram lançados com resultados da pesquisa (acesse abaixo).
O presidente do Instituto Lula, o economista Márcio Pochmann, classificou o estudo como fundamental para compreender melhor o Brasil nesse primeiro quarto do século 21. “Esse trabalho tem por objetivo informar, descrever a realidade para que a sociedade brasileira a partir desse conhecimento possa tomar consciência acerca do seu papel na transformação da realidade nacional”, afirmou.
“A invisibilidade digital a que estão relegados alguns grupos é inaceitável”, disse o bacharel em Direito André Barbosa Filho, mestre e doutor em comunicação, ao destacar a importância desse estudo que na primeira fase abordou também mulheres, negros e negras, indígenas.
Alfabetização digital
A psicanalista, jornalista e pesquisadora Cosette Castro, doutorada em Comunicação na Universidade Autônoma de Barcelona/Espanha destacou a importância da cultural digital, em todas as etapas da vida. “Inclusão digital não é só equipamento, mas uma alfabetização que importante para todos nós”, explicou. “Trabalhamos com dois grupos nessa fase da pesquisa: ativistas e militantes, e lideranças de movimentos sociais progressistas dentro do campo da Central Única dos Trabalhadores (CUT). São grupos opostos: idosos com muita dificuldade de usar redes sociais digitais; e, por outro lado, os mais jovens, LGBTQIA+, pelo quarto ano seguido as que sofrem mais violência e que têm nas redes sociais um espaço de visibilidade. Um ato social e político”
Entre as sugestões colhidas dos grupos pesquisados, está a adoção de políticas públicas de universalização da internet em periferias, áreas rurais, quilombolas, florestas. Além disso, preços populares para acesso a equipamentos modernos de tecnologia; utilização de plataformas próprias e não as internacionais; alfabetização digital para pessoas idosas; políticas de segurança e cuidado na internet para que paginas não caiam ou que entrem haters a promover ódio. Também políticas para olhar o sofrimento psíquico causado na internet e cursos para formação de lideranças ativistas na internet e para produção de conteúdos, assim como sobre educação para as mídias, sobre o que é notícia e fake news
Público LGBTQIA+
A mestre em Antropologia Social pela UFSC Milena Argenta, falou sobre as singularidades apresentadas pela pesquisa com o grupo LGBTQIA+. A primeira foi o estigma que o preconceito e a discriminação provocam, o que criou uma dificuldade de encontrar essas pessoas. “Nossa visibilidade ainda é um desafio em diversos níveis”, disse, lembrando que o anonimato foi garantindo a esse público na pesquisa.
Alguns dados chamaram a atenção em relação à violência a esse público: 70% das lideranças que responderam à pesquisa já sofreram violência na internet; entre esses, 83% devido à identidade de gênero ou orientação sexual. Entre os ativistas e militantes esses números são de 60% e 37% respectivamente.
Entre as lideranças, 77% já sofreram ataques por sua militância na internet, atuação política ou defesa de direitos. O número é de 45% para militantes e ativistas.
“Dados sobre esse público são muito raros”, disse Milena, sobre a relevância da pesquisa que identificou ainda baixo investimento das entidades representativas em tecnologia da informação e comunicação. A falta de recursos foi apontada como causa. “Mesmo assim, 92% das lideranças acessa diariamente a internet, a maioria para atividades relacionadas a atividades dos movimentos sociais ou política. “Uma grande movimentação nos espaços digitais. Porém o baixo investimento em cursos acaba resultando numa atuação pouco qualificada e insegura.”
Os idosos
A pesquisa aponta propostas também para a inclusão de pessoas idosas, um público bastante diversificado, lembrou o geógrafo Rodrigo Cardoso Bonicenha, doutor pelo programa de pós-graduação em Planejamento e Gestão do Território da Universidade Federal do ABC. A maior parte das respostas aos questionários veio de mulheres, caracterizando a feminilização da velhice, avalia Rodrigo. E 96% na faixa etária de 60 anos a 79 anos. As mais idosas, com 80 anos ou mais, tiveram pequena participação. “Isso era esperado, considerando que uma das coisas que mantém as pessoas usando as redes sociais é estar ativa no mercado de trabalho. Assim como a classe social, a escolaridade e o local de moradia.”
Enquanto no grupo de questionário online entre os ativistas 72% se identificaram como pessoas brancas, no impresso 64% se identificaram como pretas ou pardas. A pesquisa também reforça o papel do idoso como arrimo das famílias: 83% entre os que responderam o questionário online e 60% no impresso.
Quase 100% tinham internet nas suas casas entre os que responderam ao questionário online e 60% entre as respostas impressas. A maioria pelo celular, com suas limitações e custo de acesso que exclui muita gente. A participação dos idosos, na maior parte das vezes, é passiva, e principalmente via Facebook e WhatsApp: recebem conteúdo, compartilham, mas não produzem.
Inclusão digital não acontece sem que barreiras não sejam transpostas, afirma o geógrafo. “Precisamos de soluções multidimensionais, que permitam que as pessoas tenha algum grau de alfabetização, aparelhos e conexão adequadas.”
Lideranças
Entre as lideranças de entidades representativas dos trabalhadores, a doutora em Comunicação Rose Vidal, especialista em marketing digital, destacou três pontos: o choque de gerações, a acessibilidade à internet e a qualidade na contratação dos profissionais de comunicação que fazem parte dos sindicatos brasileiros.
As pesquisas indicaram que 80% dos sindicatos atendem somente profissionais com carteira assinada ou concursados. Há uma urgência de que isso seja revisto para atender de forma mais horizontalizada. “Como vou ter vários sindicatos atuando em um universo totalmente discrepante”, questionou, mencionado trabalhadores entregadores sem vínculo, os microempreendedores.
A professora destacou, ainda, que 68% das organizações em âmbito nacional e 45% locais não oferecem nenhum tipo de curso relacionado à inclusão digital. Sobre a violência na internet, 44% das lideranças sofreram ataques. “E isso antes do período eleitoral”, ressaltou. O número sobe para 68% quando o ataque na internet é direto aos dirigentes.
“Não basta ter as ferramentas, mas criar uma cultura de inclusão digital”, sugerem as lideranças pesquisadas, para colaborar com a construção da identidade desse novo trabalhador pós-moderno.
Clique nos links para baixar os PDFs das publicações referentes à pesquisa: