30/10/2013 15:10
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou na manhã desta quarta-feira (30), junto com a presidenta Dilma Rousseff e a ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza, Tereza Campello, do Ato em Comemoração aos 10 anos do Programa Bolsa Família. O encontro foi realizado no Museu Nacional, em Brasília.
Lula começou seu discurso relembrando manchetes de jornais e comentários que criticavam o programa Bolsa Família como programa que geraria mendigos, criaria vagabundos ou seria uma ilusão, uma tragédia social. Ele afirmou que os dados apresentados pela ministra Tereza Campello mostram que estas suposições eram falsas e, muitas vezes, fruto de preconceito. “É mais difícil vencer o preconceito do que vencer a fome (...) Há quem não se conforme de ver os pobres tornarem-se cidadãos mais conscientes de seus direitos”.
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O ex-presidente ressaltou ainda que muito foi feito, mas que os séculos de desigualdade no país não podem ser vencidos rapidamente. “Este é um programa que acaba de completar 10 anos, num país onde a injustiça vem de cinco séculos”. Para Lula, a relação entre o Bolsa Família e o crescimento econômico do Brasil é fundamental. “A microeconomia é um dos motivos de sermos reconhecidos no mundo pela nossa macroeconomia”, ressaltou.
E terminou: “Foi para isso que fomos eleitos, querida presidenta Dilma. Para mostrar que um outro Brasil é possível”.
Dilma ressaltou que “o Brasil tornou-se mais Brasil depois do Bolsa Família” e afirmou ser Lula o “autor e inspirador de tudo isso”. Para a presidenta, o grande mérito do programa é abrir uma porta de oportunidades para milhares de brasileiros. “O Bolsa Família veio para ser uma porta de saída da miséria e uma porta de entrada num mundo de oportunidade e esperança”.
Ela também afirmou que as críticas ao programa não farão com que ele seja diminuído e ressaltou: “Ninguém que governou de costas para os pobres pode criticam o que fizemos no combate à pobreza”.
Resultados individuais, na vida de cada pessoa, e também coletivos, que refletem em todo o país, são as óticas complementares pelas quais se pode olhar os efeitos do programa. E a presidenta ressalta. “Sob qualquer ótica que se analise os resultados alcançados nesta década, eles são extraordinários”.
“Basta de achismo, vamos aos dados”
“O Bolsa Família não existiria se não houve a decisão política de destinar recursos aos mais pobres”, começou a ministra do desenvolvimento social e combate à pobreza, Tereza Campello. Ela ressaltou que os recursos destinados ao programa representam 0,46% do Produto Interno Bruto do país, mas os efeitos são imensos.
A ministra afirmou que, depois de uma década de existência, não é mais necessário se basear em achismos e suposições, pois há dados, estatísticas e prêmios concretos que mostram os resultados do programa. Campello apresentou dados dos três objetivos principais do Bolsa Família: a diminuição da pobreza e as melhorias na educação e na saúde para seus beneficiários.
“99,1% das crianças do programa são vacinadas”, afirmou a ministra, que também do importante impacto do Bolsa Família na diminuição da desnutrição. Na educação, os dados mostram que a taxa de abandono escolar dos beneficiários é menor que a média geral em todas as etapas do ensino básico. O programa Bolsa Família teve impacto imediato na diminuição da extrema pobreza no Brasil e com a criação do Brasil sem Miséria, em 2011, essa redução chegou a 89%.
Ouça a íntegra do discurso de Lula:
Leia abaixo a íntegra do discurso escrito de Lula:
DEZ ANOS DO BOLSA FAMÍLIA – BRASÍLIA – 30/10/2013
Querida companheira presidenta da República Dilma Rousseff, querido companheiro Michael Temer, vice-presidente da República, querido companheiro Renan Calheiros presidente do Senado Federal, querido companheiro Henrique Eduardo Alves, presidente da Câmara dos Deputados, queria companheira Tereza Campello, ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, por meio de quem quero cumprimentar aqui todos os ministros presentes, que se eu for falar o nome de todos, vou perder tempo precioso aqui do meu discurso. Como nenhum de vocês é candidato, então...prefiro não citar. Queridos governadores aqui presente. Cumprimentando o companheiro Agnelo, quer cumprimentar todos os governadores aqui presentes. Companheiros deputados, companheiros senadores, companheiros prefeitos, companheiros secretários e secretárias. Companheiro Jorge Hereda, presidente da Caixa Econômica Federal. Companheiras beneficiárias do Bolsa-Família. Orquestra Criança Cidadã dos Meninos do Coque, é importante lembrar presidenta Dilma, que a primeira vez que nós nos encontramos com essa Orquestra Criança Cidadã dos Meninos do Coque, esse Danielzinho precisava subir numa cadeira para a gente enxerga-lo. E hoje ele já tava até paquerando a presidenta, olhando com um olhar meio... Meu querido companheiro Rui Falcão, presidente do Partido dos Trabalhadores, companheiro Luiz Dulci, queria cumprimentar o Patrus que está aqui.
Eu ontem estava um pouco preocupado companheira presidenta e companheira ministra, em ver o que as pessoas falavam sobre o programa Bolsa-Família há algum tempo atrás. Eu se tivesse lembrado um mês antes teria pedido para a ministra convidar alguns jornalistas, alguns especialistas e alguns políticos que fizeram julgamento do Bolsa-Família em 2003, 2004, 2005, 2006, pra vir assistir a apresentação da Tereza. De qualquer forma presidente Henrique Alves, eu acho que quem sabe algum dia fosse necessário uma sessão extraordinária na Câmara dos Deputados, para que a ministra Tereza pudesse fazer essa apresentação para os deputados e para os senadores.
Eu quero agradecer aqueles que nos momentos mais difíceis acreditaram. Se os números que a Tereza colocou ai forem verdadeiros de investimento e retorno, o BNDES vai ter que investir mais nos pobres, que o retorno é mais garantido e mais sólido. Mais apenas para ilustrar, no 21/7/2006, foi escrito em um jornal, não vou dizer o jornal, nem o jornalista, que o Bolsa-Família forma mendigos, isso era de uma adversária nossa. Outro companheiro nosso, que virou adversário dizia assim: o Bolsa- Família é uma tragédia social. O outro dizia assim: fácil de entrar, muito difícil de sair. O outro dizia assim: Bolsa-Ilusão. O outro dizia: Bolsa-Eletrodoméstico, porque as pessoas não admitiam que alguém que recebesse o Bolsa-Família comprasse algo que não fosse feijão. Até porque tento feijão, ela precisava comprar gás para cozinhar o feijão. O outro dizia Bolsa-Família é uma grande enganação. Outros diziam, Bolsa-Família é bolsa-cabresto. E por ai vai os adjetivos. Tem uma pessoa que escreveu o seguinte: a fome não é mais o que era, atinge poucas centenas de milhares de pessoas. Nunca milhões. Isso não quer dizer que não mereçam mais atenção, insistir porém em gastar mais de 9 bi ao ano, é um erro grave. E hoje em resposta a ele está se gastando 24 bilhões, não apenas 9 bilhões.
Outros diziam: Bolsa-Eletrodomésticos, outros diziam, Bolsa-Família virou esmola, outro dizia que o Bolsa-Família tinha que mudar. Ai tem uma matéria que saiu no Fantástico no horário nobre, sabe, que o meu amigo Clovis Rossi fez um artigo dizendo que “o programa visitou aleatoriamente três cidades de três estados, Maranhão, Paraná e Mato Grosso, comprovou facilmente que as pessoas que não tem a mais leve necessidade de esmola pública, não obstante a recebe. Gente até rica comparativamente na mesma cidade, no entanto, gente que não é mais pobre por impossibilidade física, não consegue cadastrar”. Ou seja, há uma coisa fantástica que a Tereza me chamava atenção um dia desses, um erro de um cadastro num programa que atende quase 14 milhões de pessoas, é tratado, quase 14 milhões de famílias, um erro de cadastro é tratado por alguns hipócritas como se fosse corrupção, como se fosse fraude, sem o menor respeito.
Outro dizia: exigência escolar é pouco relevante, espero que quem escrever esteja escondido em algum lugar, porque ele não vai ter coragem de dizer que disse isso hoje e ele tenha visto os números que a Tereza mostrou. Outro chamava o Bolsa-Família de bolsa do impasse. Um amigo meu, amigo de vocês dizia Bolsa-Família é uma tragédia social. Gasto do Bolsa-Família sobe 60%, Bolsa-Família forma mendigos, e vai por ai a fora. Faltam portas de saída para o Bolsa-Família. Engraçado, as pessoas nem tinha entrado e as pessoas já queriam que elas saíssem. Nós ainda estávamos no processo de cadastrar as pessoas e as pessoas já queriam que elas saíssem. Eu não sei porque tanto incômodo que o pobre recebesse R$70,R$100, R$150. Eu não sei o que é que incomoda. Talvez a descoberta de uma coisa que eu vou falar daqui a pouco se não vou falar o discurso, porque agora eu estou improvisando aqui.
Ai segue, bolsa-ilusão. Tem um senador que fez uma entrevista, eu não vou ler para não valoriza-lo. Mas, teve um senador que disse o seguinte, isso já no teu governo em 2011, “o Bolsa-Família não tira ninguém da miséria, mantém na miséria, porque estimula a preguiça inclusive. Há gente que não quer trabalhar. Porque não quer ter carteira de trabalho para não perder o Bolsa-Família. Ta ai a mais pura verdade”. Imagina o cara falando no microfone do Senado, você deve estar lembrado de quem falou isso Renan, mas deixa pra lá. Bem eu fiz questão de ler essas manchetes aqui, eu trouxe muitas coisas, trouxe carta de guariba, trouxe uma coisa extraordinária sobre emancipação das mulheres, quando elas ficam independentes, elas não aceitam mais esse negócio de marido bater nelas, mandar nelas, elas largam do sujeito. Bem mas eu vou deixar isso para a história. E vou ler o meu discurso aqui, porque foi para isso que eu vim aqui.
Eu queria começar dizendo que se eu tivesse de voltar no tempo, com a experiência que tenho hoje, eu começaria outra vez o meu governo pelo combate à fome e à desigualdade. Começaria outra vez pelo Bolsa Família.
Nenhum outro programa – dentre os muitos que implantamos – teve tanto impacto na construção de uma nova mentalidade no Brasil.
Digo isso porque o Bolsa Família, associado a um conjunto de políticas sociais, de valorização do salário, acesso ao crédito e geração de empregos, a formação escolar, provou que era possível, sim, acabar com a fome no nosso país.
Dez anos atrás, em meio à imensa expectativa que a nossa eleição causou, eu disse que começaria fazendo o necessário, para depois fazer o possível e, quando nos déssemos conta, estaríamos realizando o que parecia impossível para alguns. Muitos colocaram nessa última categoria o desafio de acabar com a fome.
Talvez não tenham compreendido que essa tarefa era absolutamente necessária para construir um país que nós estamos construindo.
Não faz tanto tempo assim, vivíamos como se houvesse um país para os ricos e a classe média, enquanto a maioria da população habitava uma não-pátria, que desconhecia seus direitos e lhe negava oportunidades.
O Bolsa Família integrou ao Brasil milhões de pessoas que estavam não apenas marginalizadas do processo econômico, mas apartadas do processo social.
Embora sejam gigantescos os dados envolvendo o Bolsa Família e o Brasil Sem Miséria, não há números capazes de traduzir seu significado cotidiano para cada uma dessas pessoas.
Não existe indicador estatístico para substituir a palavra dignidade – e é disso que se trata quando a mãe e o pai podem oferecer aos filhos três refeições por dia.
Não há balanço orçamentário capaz de expressar a palavra esperança – e é disso que se trata quando os pais veem as crianças frequentar a escola para ter um futuro melhor.
Por ter proporcionado tal mudança na vida das pessoas, o Bolsa Família é um programa vitorioso, que em seu tempo está mudando o curso da História em nosso querido país.
Meus amigos, minhas amigas,
Num país com um histórico de exclusão social como o nosso, era de se esperar que um programa dessa dimensão provocasse dúvidas e questionamentos.
Muita gente dizia, de boa fé, que o correto seria entregar cestas básicas às famílias, e não uma quantia em dinheiro.
A resposta é simples: não basta receber alimentos para matar a fome. É preciso ter a geladeira para conservá-los, o fogão para cozinhar e o dinheiro para comprar o gás. E as pessoas também precisam se vestir, cuidar da higiene pessoal e da limpeza da casa.
Havia críticas no começo do Bolsa-Família, de gente que se dizia especialista, que ficava incomodado quando alguém utilizada o dinheiro do Bolsa-Família para comprar uma dentadura. Ou seja, certamente esse cidadão que criticava nunca ficou sem dente e nunca tentou mastigar um pedaço de carne sem dente, ou nunca tentou comer uma castanha.
Certas reações, no entanto, levam a crer que é mais difícil vencer o preconceito do que vencer a fome.
De todas as críticas lançadas contra o Bolsa Família, a mais cruel é certamente a de que o programa iria estimular a preguiça e a dependência dos mais pobres, a vagabundagem.
Os números do MDS contradizem frontalmente essa ideia, pois 70% dos responsáveis pelas famílias têm trabalho fixo e usam o dinheiro para completar a renda.
O que essa crítica denota é uma visão extremamente preconceituosa.
Significa dizer que a pessoa é pobre por indolência, e não porque nunca teve uma chance real em nossa sociedade.
É tentar transferir, para o pobre, a responsabilidade pelo abismo social criado pelos que sempre estiveram no poder.
Felizmente, não é assim que pensa a grande maioria.
Há também os que comparam o maior e melhor programa de transferência de renda do mundo – assim considerado pela ONU – com uma simples esmola.
Só quem nunca viu uma criança desnutrida, quem nunca viu o sofrimento da mãe diante do prato vazio, poderia tentar desqualificar dessa forma o Bolsa Família.
Para a mãe que o recebe, o dinheiro que alimenta os filhos não é esmola. É um direito.
Um direito de cidadania, conquistado pelos que sempre foram esquecidos neste país.E desse direito, eu tenho certeza, nunca mais esse povo vai abrir mão.
Felizmente, essa também é uma ideia restrita ao terreno do preconceito e da mais baixa luta política.
Há quem não se conforme de ver os pobres tornarem-se cidadãos mais conscientes de seus direitos.
De ver que um eleitor, com a renda básica garantida por lei, não precisa pedir favor aos senhores da política, como habitualmente se faz nesse país.
Não precisa mais trocar o voto por um saco de feijão, uma feira, um par de sapatos ou por uma feira.
Ele está mais livre para exercer a cidadania, e é isso que preocupa certa sociologia acostumada a servir às elites brasileiras.
Chama atenção também que algumas pessoas falem tanto em porta de saída para o Bolsa Família, quando as portas da inclusão para os pobres acabam de ser abertas.
Vamos deixar bem claro: este é um programa que acaba de completar dez anos, num país aonde a injustiça vem de cinco séculos.
O Bolsa Família é, o Brasil Sem Miséria, é para os mais pobres, a porta de entrada para uma era de desenvolvimento com geração de empregos e inclusão social, que o Brasil está construindo.
Muita gente saiu do Bolsa Família porque conseguiu estudar e obter um emprego com remuneração digna.
E muitos outros vão conseguir, porque o Brasil vai continuar crescendo de maneira forte e sustentada.
Mas enquanto houver uma só família precisando de ajuda para se alimentar e manter os filhos na escola, ela vai encontrar na presidenta Dilma e no Bolsa Família o apoio necessário para receber o pão de cada dia.
Temos, por fim, os que dizem que o programa eleva o gasto público e gera desequilíbrio fiscal. São os mesmos que defendem o desemprego e a redução do salário mínimo para ajustar a economia.
Eu vi um programa de televisão essa semana e eu vi um cidadão, desses cidadãos representantes de bancos, dizendo em alto e bom som, ministro Guido, presidenta Dilma, que é preciso haver um pouco de desemprego e precisa conter os aumentos de salário para melhor esse país. E eu quero dizer que se desemprego e arrocho salarial resolvessem o problema desse país, a gente nunca teria tido os problemas que tivemos até chegarmos ao governo desse país. A Europa já teria resolvido o seu problema. Os EUA não estariam na encalacrada. Porque eu fico feliz presidenta Dilma, eu sou de um tempo, que quando as coisas estavam difíceis nesse país a gente dizia, “há uma luz no fim do túnel”. Eu voltei agora da Europa, fui fazer um debate com empresários, e lá o máximo que eles falam é que “tem um sinalzinho”. Não é nem uma luz. É um sinalzinho.
Em primeiro lugar, dinheiro público aplicado em gente, em saúde, educação e renda e comida, pelos dados que a Tereza apresentou nunca mais pode ser tratado como se fosse gasto, mas sim um grande investimento.
Eu sou favorável, mas as vezes a gente pega um bilhão, empresta para uma empresa. Ela vai fazer uma empresa, que vai gerar 200 empregos depois de pronta, e vai exportar quase nenhum gasto do que ela importa. Agora pegue um bilhão e dê no Bolsa-Família para ver quantos quilos de feijão, de carne, de buchada, de jabá, de peixe a pessoa vai comprar.
Tá provado que o dinheiro do Bolsa Família movimenta o comércio, impulsiona o consumo de alimentos, roupas e produtos de higiene. Porque as pessoas também tem direito de ter acesso as coisas.
Na verdade, a ampliação da renda, combinada com a valorização dos salários e a democratização do crédito, está na raiz do milagre que nós fizemos. Grande milagre desse país é que nós conseguimos combinar, quando eu digo nós, digo todos nós, não foi apenas o governo. Nós conseguimos combinar uma boa política macroeconômica com uma extraordinária política microeconômica. Eu falo sempre para o Guido, não esqueça nunca de lembrar que a microeconomia que está aqui, que faz com que a nossa macroeconomia seja respeitada no mundo. Sem ele a gente continuaria muito pobre e receberia o prêmio que estamos recebendo agora.
Com o Bolsa Família, nós aprendemos que muito dinheiro, nas mãos de poucos, serve para alimentar a especulação financeira e concentrar ainda mais a riqueza.
E que um pouco de dinheiro, nas mãos de muitos, serve para alimentar as pessoas, impulsionar o consumo e a produção, dinamizar o investimento e geração empregos. Faz o país crescer em benefício de todos.
Essas meninas que vieram aqui, que são pessoas do Bolsa-Família, vamos ser franco. Se a gente não tivesse no Bolsa-Família, vocês iam pensar onde vão essas donzelas, para que concurso de miss vão essas mulheres. Porque as pessoas começam a comer, e quando a gente começa a comer, a gente começa a ficar bonito. O rosto da gente não fica chupado, pega forma. Não tem nada mais feio do que a fome, gente. Não tem nada mais feio.
No final de 2002, pouco depois das eleições, melhor no dia 10 de dezembro de 2003, eu fui convidado para conversar com o presidente americano George W. Bush.
Ele falou comigo por quase uma hora sobre a guerra que os Estados Unidos estavam preparando contra o Iraque. Sobre a necessidade de pegar o Bin Laden. Que era possível exterminar o terrorismo. Falava, falava, falava. Eu tava vendo a hora dele falar “ô Lula, entra comigo nessa”.
Antes dele me convidar, eu falei, presidente deixa eu lhe explicar uma coisa. Eu moro num país que fica a 14 mil quilômetros do Iraque. O Sadam Hussein nunca me fez nada. E que a minha guerra era outra: era contra a fome e a miséria de milhões de brasileiros.
Assim como o Bolsa Família, a Guerra do Iraque também completou dez anos em 2013.
Foi uma guerra declarada sob um pretexto sabidamente falso – o de que o governo iraquiano estaria na posse de armas de destruição em massa. A única arma que eles tinham era o Sadam Hussein, que destruiu o país em troco de uma mentira.
Além das perdas humanas e de ter provocado uma tragédia social incalculável, a Guerra do Iraque consumiu 3 trilhões de dólares, segundo o nosso amigo Stiglitz.
Imaginem vocês que, com esse dinheiro seria possível levar programas de transferência de renda a um bilhão e meio de pessoas em todo mundo, durante dez anos. Ou seja, seria uma guerra muito melhor, pois seria contra um inimigo que a gente poderia vencer.
Seria o suficiente para acabar com a pobreza e impulsionar a economia global para uma nova era de crescimento.
Pensem também no que seria possível fazer com apenas uma parte dos 10 trilhões de dólares que os Estados Unidos e a União Europeia gastaram para tentar resolver a crise financeira global.
Felizmente, muitos pensam como nós e estão construindo programas contra a fome e a pobreza ao redor do planeta. Você não sabe Tereza o orgulho que eu tenho quando leio qualquer notícia, eu não leio rodapé de jornal e nem a primeira página, mas quando a notícia é boa alguém me traz. E quando eu vejo que as pessoas estão me procurando para ver como faz Bolsa-Família, Pronatec, tudo que estamos fazendo. Porque na verdade estamos num aprendizado. Eu lembro da primeira reunião do Fome Zero, que foi feita ainda no Instituto Cidadania antes de eu ser presidente. Eu lembro para passar do Fome Zero para o Bolsa-Família o que a gente discutiu.
Se o Brasil conquistou a admiração e o respeito da comunidade internacional nos últimos dez anos, muito se deve a este fato:
36 milhões de pessoas saíram da extrema pobreza, graças ao Bolsa Família e ao Brasil sem Miséria. Eu fico lembrando gente, de quando eu vim de Garanhuns para São Paulo, de 1952, eu tinha a perna tão fina e a barriga tão grande, que as pessoas se incomodavam e era só lombriga. A gente viajou 13 dias comendo um saco de farinha. Era só farinha. Os mais ricos levavam farinha e queijo. Os mais pobres era farinha e rapadura. Eu fico imaginando que foi um programa como esse, que fez conseguir tirar gente dessa situação. Garantir água potável, por tanto Tereza, esse programa do Brasil Sem Miséria de busca ativa, se for preciso fale com o Saulo, bota as forças armadas para ir localizar os companheiros, bota o exército para ir localizar os companheiros. Vamos botar todo mundo para ir atrás, todo mundo para não deixar um brasileiro sem comer.
Foi para isso que fomos eleitos, querida presidenta Dilma. Para mostrar que um outro Brasil é possível. Você lembra do tema do primeiro Fórum Social Mundial em Porto Alegre? O tema era esse. Um outro Brasil era possível e foi sobre isso que eu falei, um outro mundo era possível. Pois bem, o que nós estamos dizendo aqui, é que a única coisa impossível é Deus pecar. Fazer política social, e esses programas estão provando, é querido Mantega, querida Miriam quando for discutir o orçamento, é o seguinte: parem de regatear dinheiro para os pobres.
Eu sei que incomoda muita gente, que os pobres estão evoluindo em Pernambuco, na Bahia, Wagner, em Sergipe ou seja, os pobres estão usando os maiôs que só uma parte da sociedade usava. A patroa bota um perfume a noite para ir jantar, a empregada vem com o mesmo perfume para trabalhar de manhã, se é paraguaio ou não não sei, mas é o mesmo perfume. O patrão sai para trabalhar em um carro, vem o jardineiro com o mesmo carro atravancando o trânsito para ele. O cidadão vai para o aeroporto, chega lá tá a empregada com a família pegando o avião, pegando o lugar dele. Eu sei que é duro. Tudo isso é um aprendizado, que já aconteceu na Argentina, que já aconteceu no interior de São Paulo. E vai acontecer toda vez que os pobres tem acsenção começa a incomodar. Eu lembro que entrei um dia num restaurante e ouvi a pessoa falar “o que é que esse Lula vem fazer aqui, ele não defende os trabalhadores? O que é que ele vem fazer aqui no nosso restaurante?” Será que trabalhador tem que comer em cocho, não pode comer em restaurante também? Será que não é por isso que nós brigamos? Por tanto, querida companheira Dilma Roussef, você ainda não tem dimensão do que voc~e fez em três anos. Continue assim e fique certa de uma coisa, quem vai lhe agradecer pelo resto da vida, serão as pessoas pobres que você ajudar. Pois as outras, esquecerão com muita facilidade.
Muito obrigado,